31 de out. de 2009
B: Hein?
A: Você é meu companheiro, eu disse
B: O quê?
A: Eu disse que você é meu companheiro.
B: O que é que você quer dizer com isso?
A: Eu quero dizer que você é meu companheiro, Só isso.
B: Tem alguma coisa atrás, eu sinto.
A: Não. Não tem nada. Deixa de ser paranóico.
B: Não é disso que estou falando.
A: Você está falando do quê, então?
B: Estou falando disso que você falou agora.
A: Ah, sei. Que eu sou teu companheiro.
B: Não, não foi assim: que eu sou teu companheiro.
A: Você também sente?
B: O quê?
A: Que você é meu companheiro?
B: Não me confunda. Tem alguma coisa atrás, eu sei.
A: Atrás do companheiro?
B: È.
A: Não.
B: Você não sente?
A: Que você é meu companheiro? Sinto, sim. Claro que eu sinto. E você, não?
B: Não. Não é isso. Não é assim.
A: Você não quer que seja isso assim?
B: Não é que eu não queira: é que não é.
A: Não me confunda, por favor, não me confunda. No começo era claro.
B: Agora não?
A: Agora sim. Você quer?
B: O quê?
A: Ser meu companheiro.
B: Ser teu companheiro?
A: È.
B: Companheiro?
A: Sim.
B: Eu não sei. Por favor não me confunda. No começo era claro. Tem alguma coisa atrás, voc~e não vê?
A: eu vejo. Eu quero.
B: O quê?
A: Que você seja meu companheiro.
B: Hein?
A: Eu quero que você seja meu companheiro, eu disse.
B: O quê?
A: Eu disse que eu quero que você seja meu companheiro.
B: Você disse?
A: Eu disse?
B: Não, não foi assim: eu disse.
A: O quê?
B: Você é meu companheiro.
A: Hein?
(ad infinitum)
(Morangos Mofados- Caio Fernando Abreu)
28 de out. de 2009
Que posso dar-te tudo, o amor e a sorte
Caminhos, música e brinquedo.
É verdade que é assim:
É certo que tudo o que é meu te dou,
É certo,
Mas não te basta todo meu
Como não me basta que me dês
Todo teu.
Por isso não seremos nunca
O casal perfeito, cartão postal,
Se somos incapazes de aceitar
Que só na aritmética
O dois nasce do um mais um.
26 de out. de 2009
23 de out. de 2009
Uma mania unanime de organizar em pequenas doses as sensações e atitudes alheias. O semelhante (?) estava interessado neste resumo? A unanimidade quer transcrever a si prórpio como vago e superficial, um limite de toques.
Um limite para se expressar.
Esperemos um pouco, tudo tem um limite!
Essa opressao das expressoes está fora de controle. No ringue estao limite x ilimitado.
As emoções assistem a luta, rindo e com a certeza de que elas não possuem nenhum manual, sem grades, explodindo válvulas pulsantes sem perda de tempo. E isso é só um resumo do que elas podem fazer.
Camila Karina
22 de out. de 2009
para atravessar o saguão do mal-entendido.
Como não escorregar na cera
se os sentidos
já não me apóiam
e deslizam para longe
para todas as direções
como as contas de um colar
num chão de gelo
e nem o olhar consegue mais
alcançar, conter e contar
suas pérolas-lágrimas?
Como agarrar ou ser agarrado
nesse deserto triunfante
por alguma coisa que me ame?
Caio Fernando Abreu
21 de out. de 2009
Caio Fernando Abreu
Olho em volta, todos os soldados, companheiros fiéis da empreitada descansam.
Os semblantes espelhados em mim,mostram um leve sorriso que por trás omitem uma insólida descrença.
Acordei cansada e não acreditando em nada. Porque afinal as batalhas são travadas e morrem tantas emoções perenes do ser humano? Caminho no campo de combate observando o que me foi dado e o que me foi tirado, sem nenhuma conclusão aparente, imperceptível pela consciencia apressada.
Sinto um vazio em meio a sensação de vitória. Uma vitória isolada, sem comemoração mútua. Poderia me dar por satisfeita, afinal vencer instiga o homem e alimenta o ego, então me questiono e procuro a satisfação elementar para travar novas pelejas.
Acordei e sentia os raios solares penetrando em meus olhos como agulhas afundadas na pele, não queria abrir os olhos, eu sabia que a batalha tinha terminado e sem outro vencedor além de mim.
Ganhei a batalha.
Após refletir sobre a descrença, acreditei na fidelidade de meus companheiros. Honestamente os abracei e olhei em seus olhos (dentro de mim), todos me olhavam atentamente. Era eu, frente a frente de mim, e disse pausadamente à todos com voz suave: Esta foi uma grande guerra fria e ainda permanece do lado oposto.
Camila Karina
19 de out. de 2009
Antes que pudesse me assustar e, depois do susto, hesitar entre ir ou não ir, querer ou não querer — eu já estava lá dentro. E estar dentro daquilo era bom. Não me entenda mal — não aconteceu qualquer intimidade dessas que você certamente imagina. Na verdade, não aconteceu quase nada. Dois ou três almoços, uns silêncios. Fragmentos disso que chamamos, com aquele mesmo descuido, de "minha vida". Outros fragmentos, daquela "outra vida". De repente cruzadas ali, por puro mistério, sobre as toalhas brancas e os copos de vinho ou água, entre casquinhas de pão e cinzeiros cheios que os garçons rapidamente esvaziavam para que nos sentíssemos limpos. E nos sentíamos.
Por trás do que acontecia, eu redescobria magias sem susto algum. E de repente me sentia protegido, você sabe como: a vida toda, esses pedacinhos desconexos, se armavam de outro jeito, fazendo sentido. Nada de mal me aconteceria, tinha certeza, enquanto estivesse dentro do campo magnético daquela outra pessoa. Os olhos da outra pessoa me olhavam e me reconheciam como outra pessoa, e suavemente faziam perguntas, investigavam terrenos: ah você não come açúcar, ah você não bebe uísque, ah você é do signo de Libra. Traçando esboços, os dois. Tateando traços difusos, vagas promessas.
Nunca mais sair do centro daquele espaço para as duras ruas anônimas. Nunca mais sair daquele colo quente que é ter uma face para outra pessoa que também tem uma face para você, no meio da tralha desimportante e sem rosto de cada dia atravancando o coração. Mas no quarto, quinto dia, um trecho obsessivo do conto de Clarice Lispector "Tentação" na cabeça estonteada de encanto: "Mas ambos estavam comprometidos. Ele, com sua natureza aprisionada. Ela, com sua infância impossível". Cito de memória, não sei se correto. Fala no encontro de uma menina ruiva, sentada num degrau às três da tarde, com um cão basset também ruivo, que passa acorrentado. Ele pára. Os dois se olham. Cintilam, prometidos. A dona o puxa. Ele se vai. E nada acontece.
De mais a mais, eu não queria. Seria preciso forjar climas, insinuar convites, servir vinhos, acender velas, fazer caras. Para talvez ouvir não. A não ser que soprasse tanto vento que velejasse por si. Não velejou. Além disso, sem perceber, eu estava dentro da aprendizagem solitária do não-pedir. Só compreendi dias depois, quando um amigo me falou — descuidado, também — em pequenas epifanias. Miudinhas, quase pífias revelações de Deus feito jóias encravadas no dia-a-dia.
Era isso — aquela outra vida, inesperadamente misturada à minha, olhando a minha opaca vida com os mesmos olhos atentos com que eu a olhava: uma pequena epifania. Em seguida vieram o tempo, a distância, a poeira soprando. Mas eu trouxe de lá a memória de qualquer coisa macia que tem me alimentado nestes dias seguintes de ausência e fome. Sobretudo à noite, aos domingos. Recuperei um jeito de fumar olhando para trás das janelas, vendo o que ninguém veria.
Atrás das janelas, retomo esse momento de mel e sangue que Deus colocou tão rápido, e com tanta delicadeza, frente aos meus olhos há tanto tempo incapazes de ver: uma possibilidade de amor. Curvo a cabeça, agradecido. E se estendo a mão, no meio da poeira de dentro de mim, posso tocar também em outra coisa. Essa pequena epifania. Com corpo e face. Que reponho devagar, traço a traço, quando estou só e tenho medo. Sorrio, então. E quase paro de sentir fome.
Caio Fernando Abreu
17 de out. de 2009
Como todos os grandes apaixonados, gosto da delícia da perda de mim, em que o gozo da entrega se sofre inteiramente. E, assim, muitas vezes, escrevo sem querer pensar, num devaneio externo, deixando que as palavras me façam festas, criança menina ao colo delas. São frases sem sentido, decorrendo mórbidas, numa fluidez de água sentida, esquecer-se de ribeiro em que as ondas se misturam e indefinem, tornando-se sempre outras, sucedendo a si mesmas.
Sempre ele, Fernando Pessoa
15 de out. de 2009
Claro, é preciso julgar a si próprio com o máximo de rigidez, mas não sei se você concorda, as coisas por natureza já são tão duras para mim que não me acho no direito de endurecê-las ainda mais.
Mergulho no cheiro que não defino, você me embala dentro dos seus braços, você cobre com a boca meus ouvidos entupidos de buzinas, versos interrompidos, escapamentos abertos, tilintar de telefones, máquinas de escrever, ruídos eletrônicos, britadeiras de concreto, e você me beija e você me aperta e você me leva pra Creta, Mikonos, Rodes, Patmos, Delos, e você me aquieta repetindo que está tudo bem, tudo bem.
...Sabe que o meu gostar por você chegou a ser amor pois se eu me comovia vendo você pois se eu acordava no meio da noite só pra ver você dormindo meu Deus como você me doía de vez em quando eu vou ficar esperando você numa tarde cinzenta de inverno bem no meio duma praça então os meus braços não vão ser suficientes pra abraçar você e a minha voz vai querer dizer tanta mas tanta coisa que eu vou ficar calada um tempo enorme só olhando você sem dizer nada só olhando e pensando meu Deus como você me dói de vez em quando"
Caio Fernando Abreu
14 de out. de 2009
mas não sei quem embaralha,
que anverso tem a medalha
cujo verso é minha figura.
dormem os números do mapa;
brinco de encontrar nessas cartas
a que cegamente me inclua.
De tanta alegre insensatez
nasce a areia da passagem
para o relógio do que amei,
pelo anjo ou pelo acaso,
se estou jogando ou sou as cartas.
13 de out. de 2009
onde se jogam as fontes de luz,
te discuto em cada nome, te arranco com delicadeza de cicatriz,
vou pondo em teu cabelo cinzas de relâmpago e fitas que
dormiam na chuva.
Não quero que tenhas uma forma, que sejas precisamente o que
vem atrás da tua mão,
porque a água, considera a água, e os leões quando se dissolvem
no açúcar da fábula,
e os gestos, essa arquitetura do nada,
acendendo suas lâmpadas no meio do encontro.
Todo amanhã é o quadro onde te invento e te desenho,
disposto a te apagar, assim não és, muito menos com esse cabelo liso,
esse sorriso.
Busco tua soma, a borda da taça onde o vinho é também a lua e o espelho,
busco essa linha que faz o homem tremer
numa galeria de museu.
Além do mais te amo, e faz tempo e frio.
10 de out. de 2009
Um nó na garganta
As águas das pupilas que não desaguam
Um embrulho no estômago de socos da realidade pulsante
A gravidade sobrepondo-se na cabeça até que a sensação de explosão conclua-se internamente
Todos os globulos vermelhos convergindo-se para o orgão maior e menos visível
A temperatura efervecente como um anestésico.
Fecho os olhos.
ck
8 de out. de 2009
I can't believe that life's so complex
When I just want to sit here and watch you undress
I can't believe that life's so complex
When I just want to sit here and watch you undress
This is love, this is love
That I'm feeling
This is love, this is love
That I'm feeling
This is love
That I'm feeling
Does it have to be a life full of dread
I wanna chase you round the table, I wanna touch your head
Does it have to be a life full of dread
I wanna chase you round the table, I wanna touch your head
This is love, this is love
That I'm feeling
This is love, this is love
That I'm feeling
This is love
That I'm feeling
I can't believe that the axis turns on suffering
When you taste so good
I can't believe that the axis turns on suffering
When my head burns
Love, love, love
That I'm feeling
This is love, this is love
That I'm feeling
This is love, love, love
That I'm feeling
Even in the summer
Even in the spring
You can never get too much of
A wonderful thing
You're the only story that I never told
You're my dirty little secret, wanna keep you so
You're the only story that never been told
You're my dirty little secret, wanna keep you so
Come on out, come on over, help me forget
Keep the walls from falling as they're tumbling in
Come on out, come on over, help me forget
Keep the walls from falling on me, tumbling in
Keep the walls from falling as they're tumbling in
This is love, this is love
That I'm feeling
This is love, this is love
That I'm feeling
This is love, this is love
That I'm feeling
This is love, love, love
That I'm feeling
*Música de Pj Harvey
6 de out. de 2009
5 de out. de 2009
Júlio Cortázar
4 de out. de 2009
Talvez os pensamentos possam confundir. Mas o sentir? Quem é o gerenciador da roleta russa das emoções?
É inevitável você sentar, excitar todos os cinco sentidos em busca do feed back. E quando os espelhos do outrem não refletem isso, o que podemos fazer?
Criar personagens e de alguma forma salvar a sí mesmo de se perder nesta empreitada? Sinceramente, não sei a resposta para nenhuma destas perguntas. A intuição ainda é o livro salva-vida de bolso mais eficaz, o autor é o coração, geralmente ele acerta.
Mas como dizia Mário Quintana : "As respostas certas não interessam, o que realmente interessa são as perguntas certas"